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| CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO | |
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Autor | Mensagem |
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Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sex Jun 05, 2009 5:31 pm | |
| Poeta e crítico francês, Charles-Pierre Baudelaire nasceu em Paris em 9 de abril de 1821. Desavenças com o padrasto forçaram-no a interromper seus estudos, iniciados em Lyon, para uma viagem à Índia, que interrompeu nas ilhas Maurício. Ao regressar, dissipou seus bens nos meios boêmios de Paris, onde conheceu a atriz Jeanne Duval, uma de suas musas. Outras seriam, depois, Mme. Sabatier e a atriz Marie Daubrun. Endividado, foi submetido a conselho judiciário pela família, que nomeou um tutor para controlar seus gastos. Baudelaire permaneceu sempre em conflito com esse tutor, Ancelle.
Famoso por suas Flores do mal, influenciou toda a poesia simbolista mundial e lançou as bases da poesia moderna.
Baudelaire marcou com sua presença as últimas décadas do século XIX, influenciando a poesia internacional de tendência simbolista. De sua maneira de ser originaram-se na França os poetas "malditos". De sua obra derivaram os procedimentos anticonvencionais de Rimbaud e Lautréamont, a musicalidade de Verlaine, o intelectualismo de Mallarmé, a ironia coloquial de Corbière e Laforgue.
Acontecimento capital na vida do poeta é o processo a que foi submetido em 1857, ao publicar Les Fleurs du mal (As flores do mal). Além de condená-lo a uma multa por ultraje à moral e aos bons costumes, a justiça obrigou-o a retirar do volume seis poemas. Só a partir de 1911 apareceram edições completas da obra.
Mal compreendida por seus contemporâneos, apesar de elogiada por Victor Hugo, Teóphile Gautier, Gustave Flaubert e Théodore de Banville, a poesia de Baudelaire está marcada pela contradição. Revela, de um lado, o herdeiro do romantismo negro de Edgar Allan Poe e Gérard de Nerval, e de outro o poeta crítico que se opôs aos excessos sentimentais e retóricos do romantismo francês.
Uma nova estratégia da linguagem - Quase toda a crítica moderna concorda que Baudelaire inventou uma nova estratégia da linguagem. Erich Auerbach observou que sua poesia foi a primeira a incorporar a matéria da realidade grotesca à linguagem sublimada do romantismo. Nesse sentido Baudelaire criou a poesia moderna, concedendo a toda realidade o direito de ser submetida ao tratamento poético.
A atividade de Baudelaire se dividiu entre a poesia, a crítica literária e de arte e a tradução. Seu maior título são Les Fleurs du mal, cujos poemas mais antigos datam de 1841. Além da celeuma judicial, o livro despertou hostilidades na imprensa e foi julgado por muitos como um subproduto degenerado do romantismo.
Tanto Les Fleurs du mal como os Petits poèmes en prose (1868; Pequenos poemas em prosa), depois intitulados Le Spleen de Paris (1869) e publicados em revistas desde 1861, introduziram elementos novos na linguagem poética, fundindo o grotesco ao sublime e explorando as secretas analogias do universo. Para fixar a nova forma do poema em prosa, Baudelaire usou como modelo uma obra de Aloïsius Bertrand, Gaspard de la nuit (1842; Gaspar da noite), se bem tenha ampliado em muito suas possibilidades.
Crítica de arte e traduções - Baudelaire destacou-se desde cedo como crítico de arte. O Salon de 1845 (Salão de 1845) e o Salon de 1846 (Salão de 1846) datam do início de sua carreira. Seus escritos posteriores foram reunidos em dois volumes póstumos, com os títulos de L'Art romantique (1868; A arte romântica) e Curiosités esthétiques (1868; Curiosidades estéticas). Revelam a preocupação de Baudelaire de procurar uma razão determinante para a obra de arte e fundamentam assim um ideário estético coerente, embora fragmentário, e aberto às novas concepções.
Extensão da atividade crítica e criadora de Baudelaire foram suas traduções de Edgar Allan Poe. Dos ensaios críticos de Poe, sobretudo "The Poetic Principle" (1876; "O princípio poético"), Baudelaire tirou as diretrizes básicas de sua poética, voltada contra os excessos retóricos: a exclusão da poesia dos elementos de cunho narrativo; e a relação entre a intensidade e a brevidade das composições.
Ainda um outro Baudelaire é o revelado em suas obras especulativas e confessionais. É o caso de Les Paradis artificiels, opium et haschisch (1860; Os paraísos artificiais, ópio e haxixe), especulações sobre as plantas alucinógenas, parcialmente inspiradas nas Confessions of an English Opium-Eater (1822; Confissões de um comedor de ópio) de Thomas De Quincey; e de Journaux intimes (1909; Diários íntimos) -- que contém "Fusées" (notas escritas por volta de 1851) e "Mon coeur mis a nu" ("Meu coração desnudo") --, cuja primeira edição completa foi publicada em 1909. Tais escritos são o testamento espiritual do poeta, confissões íntimas e reflexões sobre assuntos diversos.
Quer pelo interesse inerente a sua grande poesia, quer pelos vislumbres que essas confissões propiciam, Baudelaire se destaca entre os poetas franceses mais estudados por ensaístas e críticos. Jean-Paul Sartre situou-o como protótipo de uma escolha existencial que teria repercussões no século XX, enquanto a crítica centrada nas relações históricas, como a de Walter Benjamin, dedicou-se a examinar sua consciência secreta de uma relação impossível com o mundo social.
Após uma existência das mais atribuladas, Baudelaire morreu de paralisia geral em Paris em 31 de agosto de 1867, quando mal começava a ser reconhecida sua influência duradoura sobre a evolução da poesia.
Última edição por Anarca em Ter Jan 19, 2010 7:41 pm, editado 4 vez(es) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sex Jun 05, 2009 5:32 pm | |
| As Jóias
A amada estava nua e, por ser eu seu amante, Das jóias só guardara as que o bulício inquieta, Cujo rico esplendor lhe dava esse ar triunfante Que em seus dias de glória a escrava moura afeta. Quando ela dança e entorna um timbre acre e sonoro, Este universo mineral que à luz figura Ao êxtase me leva, e é com furor que adoro As coisas em que o som ao fogo se mistura. Ela estava deitada e se deixava amar, E do alto do divã, imersa em paz, sorria A meu amor profundo e doce como o mar, Que ao corpo, como à escarpa, em ondas lhe subia. O olhar cravado em mim, como um tigre abatido, Com ar vago e distante ela ensaiava poses, E o lúbrico fervor à candidez unido Punha-lhe um novo encanto às cruéis metamorfoses. E sua perna e o braço, a coxa e os rins, untados Como de óleo, imitar de um cisne a fluida linha, Passavam diante de meus olhos sossegados; E o ventre e os seios, como cachos de uma vinha, Se aproximavam, mais sutis que Anjos do Mal, Para agitar minha alma enfim posta em repouso, Ou arrancá-la então a rocha de cristal Onde, calma e sozinha, ela encontra pouso. Como se a luz de um novo esboço, unidade eu via De Antíope a cintura a um busto adolescente, De tal modo que os quadris moldavam-lhe a bacia. E a maquilagem lhe era esplêndida e luzente! - E estando a lamparina agora agonizante, Como na alcova houvesse a luz só da lareira, Toda vez que emitia um suspiro faiscante, Inundava de sangue essa pele trigueira.
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sex Jun 05, 2009 5:34 pm | |
| A Beleza De um sonho escultural tenho a beleza rara, E o meu seio, — jardim onde cultivo a dor, Faz despertar no Poeta um vivo e intenso amor, Com a eterna mudez do marmor' de Carrara
Sou esfinge subtil no Azul a dominar, Da brancura do cisne e com a neve fria; Detesto o movimento, e estremeço a harmonia; Nunca soube o que é rir, nem sei o que é chorar.
O Poeta, se me vê nas atitudes fátuas Que pareço copiar das mais nobres estátuas, Consome noite e dia em estudos ingentes..
Tenho, p'ra fascinar o meu dócil amante, Espelhos de cristal, que tornaram deslumbrante A própria imperfeição: - os meus olhos ardentes!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sex Jun 05, 2009 5:36 pm | |
| A Alma do Vinho
A alma do vinho assim cantava nas garrafas: "Homem, ó desherdado amigo, eu te compús, Nesta prisão de vidro e lacre em que me abafas, Um cântico em que há só fraternidade e luz!
Bem sei quanto custa, na colina incendida, De causticante sol, de suor e de labor, Para fazer minha alma e engendrar minha vida; Mas eu não hei de ser ingrato e corruptor,
Porque eu sinto um prazer imenso quando baixo À guela do homem que já trabalhou demais, E seu peito abrasante é doce tumba que acho Mais propícia ao prazer que as adegas glaciais.
Não ouves retinir a domingueira toada E esperanças chalrar em meu seio, febrís? Cotovelos na mesa e manga arregaçada, Tu me hás de bendizer e tu serás feliz:
Hei de acender-te o olhar da esposa embevecida; A teu filho farei voltar a força e a cor E serei para tão tenro atleta da vida Como o óleo que os tendões enrija ao lutador.
Sobre ti tombarei, vegetal ambrosia, Grão precioso que lança o eterno Semeador, Para que enfim do nosso amor nasça a poesia Que até Deus subirá como uma rara flor!"
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sáb Jun 06, 2009 5:37 pm | |
| A Cabeleira
Ó tosão que até a nuca encrespa-se em cachoeira! Ó cachos! Ó perfume que o ócio faz intenso! Êxtase! Para encher à noite a alcova inteira Das lembranças que dormem nessa cabeleira, Quero agitá-la no ar como se agita um lenço!
Uma Ásia voluptuosa e uma África escaldante, Todo um mundo longínquo, ausente, quase morto, Revive em teus recessos, bosque trescalante! Se espíritos vagueiam na harmonia errante, O meu, amor! Em teu perfume flui absorto.
Adiante irei, lá, onde a vida a latejar, Se abisma longamente sob a luz dos astros; Revoltas tranças, sede a vaga a me arrastar! Dentro de ti guardas um sonho, negro mar, De velas, remadores, flâmulas e mastros:
Um porto em febre onde minha alma há de beber A grandes goles o perfume, o som e a cor; Lá, onde as naus, contra as ondas de ouro a se bater, Abrem seus vastos braços para receber A glória de um céu puro e de infinito ardor.
Mergulharei a fonte bêbada e amorosa Nesse sombrio oceano onde o outro está encerrado; E minha alma sutil que sobre as ondas goza Saberá voz achar, ó concha preguiçosa! Infinito balouço do ócio embalsamado!
Coma azul, pavilhão de trevas distendidas, Do céu profundo dai-me a esférica amplidão; Na trama espessa dessas mechas retorcidas Embriago-me febril de essências confundidas Talvez de óleo de coco, almíscar e alcatrão.
Por muito tempo! Sempre! Em tua crina ondeante Cultivarei a pérola, a safira e o jade, Para que meu desejo em teus ouvidos cante! Pois não és o oásis onde sonho, o odre abundante Onde sedento bebo o vinho da saudade?
(Charles Baudelaire) | |
| | | Sam
Mensagens : 34 Data de inscrição : 06/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sáb Jun 06, 2009 7:34 pm | |
| - Anarca escreveu:
- A Cabeleira
Ó tosão que até a nuca encrespa-se em cachoeira! Ó cachos! Ó perfume que o ócio faz intenso! Êxtase! Para encher à noite a alcova inteira Das lembranças que dormem nessa cabeleira, Quero agitá-la no ar como se agita um lenço!
Uma Ásia voluptuosa e uma África escaldante, Todo um mundo longínquo, ausente, quase morto, Revive em teus recessos, bosque trescalante! Se espíritos vagueiam na harmonia errante, O meu, amor! Em teu perfume flui absorto.
Adiante irei, lá, onde a vida a latejar, Se abisma longamente sob a luz dos astros; Revoltas tranças, sede a vaga a me arrastar! Dentro de ti guardas um sonho, negro mar, De velas, remadores, flâmulas e mastros:
Um porto em febre onde minha alma há de beber A grandes goles o perfume, o som e a cor; Lá, onde as naus, contra as ondas de ouro a se bater, Abrem seus vastos braços para receber A glória de um céu puro e de infinito ardor.
Mergulharei a fonte bêbada e amorosa Nesse sombrio oceano onde o outro está encerrado; E minha alma sutil que sobre as ondas goza Saberá voz achar, ó concha preguiçosa! Infinito balouço do ócio embalsamado!
Coma azul, pavilhão de trevas distendidas, Do céu profundo dai-me a esférica amplidão; Na trama espessa dessas mechas retorcidas Embriago-me febril de essências confundidas Talvez de óleo de coco, almíscar e alcatrão.
Por muito tempo! Sempre! Em tua crina ondeante Cultivarei a pérola, a safira e o jade, Para que meu desejo em teus ouvidos cante! Pois não és o oásis onde sonho, o odre abundante Onde sedento bebo o vinho da saudade?
(Charles Baudelaire) Eu sou o Sam Não gosto de poetas franceses | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Dom Jun 07, 2009 12:07 am | |
| A Fonte de Sangue
Sinto por vezes que meu sangue corre em fluxos, Assim qual uma fonte em rítmicos soluços. Eu bem que o escuto numa súplica perdida, Mas me tateio em vão em busca da ferida.
Pela cidade vai, como entre espessos buxos, As lajes transformando em ilhas e repuxos, Matando a sede em cada boca ressequida E a paisagem deixando em púrpura tingida.
Muitas vezes pedi a um vinho caviloso Aplacar por um dia o horror que me domina; O vinho aguça o ouvido e os olhos ilumina!
Busquei então no amor um sono descuidoso; Mas o amor para mim é um leito de suplício Que a sede há de saciar a essas nifas do vício!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Dom Jun 07, 2009 12:46 pm | |
| A Giganta
No tempo em que a Natura, augusta, fecundanta, Seres descomunais dava {a terra mesquinha, Eu quisera viver junto d'uma giganta, Como um gatinho manso aos pés d'uma rainha!
Gosta de assistir-lhe ao desenvolvimento Do corpo e da razão, aos seus jogos terríveis; E ver se no seu peito havia o sentimento Que faz nublar de pranto as pupilas sensíveis
Percorrer-lhe a vontade as formas gloriosas, Escalar-lhe, febril, as colunas grandiosas; E às vezes, no verão, quando no ardente solo
Eu visse deitar, numa quebreira estranha estranha, Dormir serenamente à sombra do seu colo, Como um pequeno burgo ao sopé da montanha!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Seg Jun 08, 2009 5:44 pm | |
| A Morte dos Pobres
A morte é que consola e que nos faz viver É o alvo desta vida e a única esperança Que, como um elixir, nos dá fé e confiança, E forças para andar até o anoitecer.
Em meio à tempestade e à neve a se desfazer, E a luz que em nosso lívido horizonte avança, E a pusada que um livro diz como se alcança, E onde se pode descansar e adormecer.
E um arcanjo que tem nos dedos imantados O sono eterno e o dom dos sonhos extasiados, E arruma o leito para os nus e os desvalidos;
E dos deuses a glória e o místico celeiro E a sacola do pobre e o seu lar verdadeiro O pórtico que se abre aos Céus desconhecidos!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Ter Jun 09, 2009 5:02 pm | |
| A Musa Enferma
Ah, minha pobre musa, o que tens esta vez? Teus olhos ocos são todos visões noturnas E alternativamente refletes na tez Loucura com horror, as sombras taciturnas.
Sobre ti, róseos duende e súcubo esverdeado Derramam o medo e o amor de suas urnas? O pesadelo, o punho despótico e irado, Afogou-te no fundo de incerto Minturnas?
Quisera que, exalando o aroma da saúde, Fosse teu seio só a força e a juventude, Que o teu sangue cristão fosse fluxos marítimos
Como o inúmero som destes antigos ritmos Em que alternam seu reino o inventor da cantiga Febo e o divino Pã, o senhor da áurea espiga.
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Qui Jun 11, 2009 11:01 pm | |
| A musa Venal
Ó musa de minha alma, amante dos palácios, Terás, quando janeiro desatar seus ventos, No tédio negro dos crepúsculos nevoentos, Uma brasa que esquente os teus dois pés violáceos?
Aquecerás teus níveos ombros sonolentos Na luz noturna que os postigos deixam coar? Sem um níquel na bolsa e seco o paladar, Colherás o ouro dos cerúleos firmamentos?
Tens que, para ganhar o pão de cada dia, Esse turíbulo agitar nas sacristia, Entoar esse Te Deum que nada têm de novo,
Ou, bufão em jejum, exibir teus encantos E teu riso molhado de invisíveis prantos Para desopilar o fígado do povo.
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sex Jun 12, 2009 10:06 pm | |
| A Musa Doente
O que tens essa manhã, ó musa de ar magoado? Teus olhos estão cheios de visões noturnas, E vejo que em teu rosto afloram lado a lado A loucura e a aflição, frias e taciturnas.
Teria o duende róseo ou o súcubo esverdeado Te ungido com o medo e o mel de suas urnas? O sonho mau, de um punho déspota e obcecado, Nas águas te afogou de um mítico Minturnas ?
Quisera eu que, vertendo o odor da exuberância, O pensamento fosse em ti uma constância E que o sangue cristão te fluísse na cadência
Das velhas sílabas de uníssona freqüência, Quando reinavam Febo, o criador das cantigas, E o grande Pã, senhor do campo e das espigas.
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sáb Jun 13, 2009 4:02 pm | |
| A Serpente que Dança
Que eu te amo ver, lânguida amante, Do corpo que excele Como um tecido vacilante, Transluzir a pele!
Sobre o teu cabelo profundo De acre, perfumado, mar odorante e vagabundo, Moreno e azulado,
Como um navio que desponta, Ao vento matutino Em sonho minha alma se apronta, Para um céu sem destino.
Nos teus olhos ninguém lobriga Doçura ou martírio, São jóias frias que são liga De ouro e letargírio.
Ao ver teu corpo que balança, Bela de exaustão, Dir-se-ia serpente que dança Em torno de um bastão.
Todos os ócios com certeza Tua fronte movem Que passeia com a moleza De elefante jovem,
E o teu corpo se alonga e pende Tal nave se mágoas, Que as margens deixa e após estende Suas vergas na água.
Onda crescida da fusão De gelos frementes Se a água de tua boca então Alcança os teus dentes,
Bebo uma taça rubra e cheia Muita amarga e calma, Um líquido céu que semeia Astros em minha alma!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Seg Jun 15, 2009 2:09 pm | |
| A Teodoro de Banville
Por tal modo agarraste a Deusa pela crina, Com ar dominador, num gesto sacudido Que se alguém presenceia o caso acontecido Poderia julgar-te um rufião de esquina.
Com o límpido olhar, — precoce e ardente vista, Audaz, vais expandido o orgulho de arquitecto Em nobres produções, de traço tão correcto, Que deixam futurar um prodigioso artista.
O nosso sangue, Poeta, esvai-se dia a dia!... Acaso, do Centauro, a túnica sombria, — Qie e, fúnebres caudais as velas transformava —
Três vezes se tingiu com as barbas subtis D'aqueles infernais, monstruosos, répteis, Que Hércules, em crença, a rir, estrangulava?
(Charles Baudelaire) | |
| | | Vitor mango
Mensagens : 440 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Seg Jun 15, 2009 2:49 pm | |
| ACHO QUE DESCOBRI A RAZAO PORQUE NAO GOSTO DE VERSOS tUDO A VER COM TEATRO E POR TABELA CINEMA PORTUGUES No Teatro os artistas gritavam para que na piolheira o pessoal conseguisse ouvir o paleio E a arte de falar era rigida estatica ( a Opera tinha nuances do mesmo mal Depois veio o cinema e os artistas do teatro foram postos á frente das camaras e esqueciam-se que estavam no cinema Então abriam as goelas e saia uma mistela entre grito e faladura Depois ainda pior Falavam para que o publico mais fiel percebesse Conta-se uma Historia que no filme Chaimite um rival amanda um balazio no que lhe andava a cheirar a namorada e e realizador com medo que o pessoal nao percebesse que aquilo era morte matada aproxima as camaras e o defunto pronuncia AHHH maroto que me mataste Adoro prosar e ler prosapias mas quando toca em veros lembro-me da grande-eloquencia dos gestos vastos e largos a falar no Coraçao e o versajador a meter a palma da mao no peito e depois aponta o luar da Lua mesmo que nao haja lua Numas mais fui aso cinerma nem ao teatro apesar de muita gente me assoprar que HOJE as coisas nada tem a ver com o antanho e que ate teatralizamos bem
e porque gosto de prosa Porque na prosa eu posso levar o leitor para onde eu quizer e parti-lo ao meio com a emoçao Na poesia essa mesma emoçao esta ja estampada nas escadas do rimar enm formulas ja expremidas
Quando ao Teatro lembro-me que foi o Almeida Negreiros que numa entrevista do ZIP ZIP deu um autentico show -...nunca na PU** da vida vi um gajo com tanta classe Ele falava curto e um gajo coçava os miolos perante tanto sumo
assim meus caros nao me chamem inculto porque ianda hoje andei a plantar rabanetes alfaces e marmelos Pois Tudo em prosa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Ter Jun 16, 2009 2:56 pm | |
| A Uma Dama Crioula
No país perfumado, a um sol de fogo e pena, Conheci sob dossel de árvores purpurado, E de palmas de onde o ócio ao nosso olhar acena, Uma dama crioula e de encanto ignorado.
De tez pálida e quente, a mágica morena Tem no seu colo um ar, sempre o mais requintado; Vai como a caçadora e é imponente e serena, Seu sorriso é tranqüilo e seu olhar confiado.
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Qui Jun 18, 2009 11:33 am | |
| A Uma Passante
A rua, em torno, era ensurdecedora vaia. Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa, Uma mulher passou, com sua mão vaidosa Erguendo e balançando a barra alva da saia;
Pernas de estátua, era fidalga, ágil e fina. Eu bebia, como um basbaque extravagante, No tempestuoso céu do seu olhar distante, A doçura que encanta e o prazer que assassina.
Brilho... e a noite depois! - Fugitiva beldade De um olhar que me fez nascer segunda vez, Não mais te hei de rever senão na eternidade?
Longe daquí! tarde demais! nunca talvez! Pois não sabes de mim, não sei que fim levaste, Tu que eu teria amado, ó tu que o adivinhaste!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sáb Jun 20, 2009 9:33 pm | |
| A Vida Interior
Muito tempo habitei sob pórticos altos Que ardendo aos sóis do mar em fogos caprichosos, Com seus grandes pilares retos, majestosos, Tinham, de noite, um ar de grutas de basaltos.
As ondas, refletindo os céus imaginosos, Iam, solenemente, em místicos assaltos, Misturando os acordes ricos dos seus saltos Às tintas do sol-poente em meus olhos ociosos.
Foi aí que vivi nas volúpias mais calmas, Circundado de azul, de vagas, de esplendores, De escravos todos nus impregnados de odores,
Refrescando-me a fronte ao embalo das palmas, E cujo único intento era o de aprofundar O mal que me fazia aos poucos definhar.
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Qua Jun 24, 2009 10:03 pm | |
| Amo a Recordação Daqueles Tempos Nús
Amo a recordação daqueles tempos nus Quando Febo esculpia as estátuas na luz. Ligeiros, Macho e fêmea, fiéis ao som da lira, Ali brincavam sem angústia e sem mentira, E, sob o meigo céu que lhes dourava a espinha, Exibiam a origem de uma nobre linha. Cibele , então fecunda em frutos generosos, Nos filhos seus não via encargos onerosos: Qual loba fértil em anônimas ternuras, Aleitava o universo com as tetas duras. Robusto e esbelto, tinha o homem por sua lei Gabar-se das belezas que o sagravam rei, Sementes puras e ainda virgens de feridas, Cuja macia tez convidava às mordidas!
Quando se empenha o Poeta em conceber agora Essas grandezas raras que ardiam outrora, No palco em que a nudez humana luz sem brio Sente ele n'alma um tenebroso calafrio Ante esse horrendo quadro de bestiais ultrajes. Ó quanto monstro a deplorar os próprios trajes! Ó troncos cômicos, figuras de espantalhos! Ó corpos magros, flácidos, inflados, falhos, Que o deus utilitário, frio e sem cansaço, Desde a infância cingiu em suas gases de aço! E vós, mulheres, mais seráficas que os círios, Que a orgia ceva e rói, vós, virgens como lírios, Que herdaram de Eva o vício da perpetuidade E todos os horrores da fecundidade!
Possuímos, é verdade, impérios corrompidos, Com velhos povos de esplendores esquecidos: Semblantes roídos pelos cancros da emoção, E por assim dizer belezas de evasão; Tais inventos, porém, das musas mais tardias Jamais impedirão que as gerações doentias Rendam à juventude uma homenagem grave - À juventude, de ar singelo e fronte suave, De olhar translúcido como água de corrente, E que se entorna sobre tudo, negligente, Tal qual o azul do céu, os pássaros e as flores, Seus perfumes, seus cantos, seus doces calores.
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sex Jun 26, 2009 8:30 pm | |
| As Litânias de Satã
Ó tu, o Anjo mais belo e também o mais culto, Deus que a sorte traiu e privou do seu culto, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Ó Príncipe do exílio a quem alguém fez mal, E que, vencido, sempre te ergues mais brutal, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu que vês tudo, ó rei das coisas subterrâneas, Charlatão familiar das humanas insânias, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu que, mesmo ao leproso, ao paria infame, ao réu Ensinas pelo amor às delícias do Céu, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu que da morte, tua velha e forte amante, Engendraste a Esperança, - a louca fascinante! Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu que dás ao proscrito esse alto e calmo olhar Que faz ao pé da forca o povo desvairar, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu que sabes onde é que em terras invejosas O Deus ciumento esconde as pedras preciosas. Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu cuja larga mão oculta os precipícios, Ao sonâmbulo a errar na orla dos edifícios, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu que, magicamente, abrandas como mel Os velhos ossos do ébrio moído num tropel, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu, que ao homem que é fraco e sofre deste o alvitre De poder misturar ao enxofre o salitre, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu que pões tua marca, ó cúmplice sutil, Sobre a fronte do Creso implacável e vil, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Tu que, abrindo a alma e o olhar das raparigas a ambos Dás o culto da chaga e o amor pelos molambos, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Do exilado bordão, lanterna do inventor, Confessor do enforcado e do conspirador, Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria! Pai adotivo que és dos que, furioso, o Mestre O deus Padre, expulsou do paraíso terrestre Tem piedade, ó Satã, desta longa miséria!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Dom Jun 28, 2009 10:02 pm | |
| Ciganos em Viagem
A tribo que prevê a sina dos viventes Levantou arraiaes hoje de madrugada; Nos carros, as mulher', c'o a torva filharada Às costas ou sugando os mamilos pendentes;
Ao lado dos carrões, na pedregosa estrada, Vão os homens a pé, com armas reluzentes, Erguendo para o céu uns olhos indolentes Onde já fulgurou muita ilusão amada.
Na buraca onde está encurralado, o grilo, Quando os sente passar, redrobra o meigo trilo; Cibela, com amor, traja um verde mais puro,
Faz da rocha um caudal, e um vergel do deserto, Para assim receber esses p'ra quem 'stá aberto O império familiar das trevas do futuro!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sáb Jul 04, 2009 11:06 pm | |
| Esterilidade
Ao vê-la caminhar em trajo vaporosos, Parece que desliza em voluptuosa dança, Como aqueles reptis da Índia, majestosos, Que um faquir faz mover em torno d'uma lança.
Como um vasto areal, ou como um céu ardente, Como as vagas do mar em seu fragor insano, - Assim ela caminha, a passo, indiferente, Insensível à dor, ao sofrimento humano.
Seus olhos teem a luz dos cristais rebrilhantes, E o seu todo estranho onde, a par, se lobriga O anjo inviolado e a muda esfinge antiga,
Onde tudo é fulgor, ouro, metais, diamantes Vê-se resplandecer a fria majestade Da mulher infecunda - essa inutilidade!
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Qui Jul 09, 2009 12:23 pm | |
| Gênio do Mal
Gostavas de tragar o universo inteiro, Mulher impira e cruel! Teu peito carniceiro, Para se exercitar no jogo singular, Por dia um coração precisa devorar. Os teus olhos, a arder, lembram as gambiarras Das barracas de feira, e prendem como garras; Usam com insolência os filtros infernais, Levando a perdição às almas dos mortais.
Ó monstro surdo e cego, em maldades fecundo! Engenho salutar, que exaure o sangue do mundo Tu não sentes pudor? o pejo não te invade? Nenhum espelho ha que te mostre a verdade? A grandeza do mal, com que tu folgas tanto. Nunca, jamais, te fez recuar com espanto Quando a Natura-mãe, com um fim ignorado, - Ó mulher infernal, rainha do Pecado! - Vai recorrer a ti para um génio formar?
Ó grandeza de lama! ó ignomínia sem par
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Seg Jul 13, 2009 9:25 pm | |
| O Albatroz
Às vezes, por prazer, os homens de equipagem Pegam um albatoz, enorme ave marinha, Que segue, companheiro indolente de viagem, O navio que sobre os abismos caminha.
Mal o põem no convés por sobre as pranchas rasas, Esse senhor do azul, sem jeito e envergonhado, Deixa doridamente as grandes e alvas asas Como remos cair e arrastar-se a seu lado.
Que sem graça é o viajor alado sem seu nimbo! Ave tão bela, como está cômica e feia! Um o irrita chegando ao seu bico em cachimbo, Outro põe-se a imitar o enfermo que coxeia!
O poeta é semelhante ao príncipe da altura Que busca a tempestade e ri da flecha no ar; Exilado no chão, em meio à corja impura, A asa de gigante impedem-no de andar.
(Charles Baudelaire) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: CHARLES BAUDELAIRE - O POETA MALDITO Sáb Jul 18, 2009 7:05 pm | |
| O Frasco
Perfumes há que os poros da matéria filtram E no cristal dir-se-ia até que eles se infiltram. Ao abrirmos um cofre que nos vem do Oriente Cujo ferrolho range e emperra asperamente,
Ou numa casa algum poeirento e negro armário, Onde o acre odor dos tempos dorme solitário, Talvez se encontre um frasco a recordar o outrora, Do qual uma alma palpitante se evapora.
Pensamentos dormiam, ninfas moribundas, A fremir com doçura em meio às trevas fundas, E as asas distendiam para alçar-se, estriadas De azul e rosa, ou de ouro arcaico laminadas.
Eis as lembranças inebriantes que se afligem No ar convulso; fecham-se os olhos; a Vertigem Subjuga a alma vencida e empurra com a mão A um vórtice que exala a humana podridão;
Abate-a às bordas de um abismo milenário, Onde, qual Lázaro rasgando seu sudário, Se move ao despertar o defunto espectral De um velho amor malsão, gracioso e sepulcral.
Assim, quando de tudo eu me tornar ausente, Ao canto de um sinistro armário indiferente, Quando esquecido eu for, qual frasco desolado, Caduco, imundo, abjeto, poeirento, rachado,
Serei teu ataúde, amável pestilência, Testemunho de tua força e virulência, Veneno angelical, licor que sem perdão Me rói, ó vida e morte de meu coração!
(Charles Baudelaire) | |
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