| | FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 | |
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Autor | Mensagem |
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Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Dom Set 13, 2009 1:33 pm | |
| O Escrúpulo é a Morte da Acção
O escrúpulo é a morte da acção. Pensar na sensibilidade alheia é estar certo de não agir. Não há acção, por pequena que seja - e quanto mais importante, mais isso é certo - que não fira outra alma, que não magoe alguém que não contenha elementos de que, se tivermos coração, nos não tenhamos que arrepender. Muitas vezes tenho pensado que a filosofia real do eremita estará antes no esquivar-se a ser hostil, pelo simples facto de viver, do que em qualquer pensamento directamente relacionado com o isolar-se.
Fernando Pessoa (Barão de Teive), in 'A Educação do Estóico' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Ter Set 15, 2009 12:43 pm | |
| A Pressa Febril da Vida Moderna
A lentidão da nossa vida é tão grande que não nos consideramos velhos aos quarenta anos. A velocidade dos veículos retirou a velocidade às nossas almas. Vivemos muito devagar e é por isso que nos aborrecemos tão facilmente. A vida tornou-se para nós uma zona rural. Não trabalhamos o suficiente e fingimos trabalhar demasiado. Movemo-nos muito rapidamente de um ponto onde nada se faz para outro onde não há nada que fazer, e chamamos a isto a pressa febril da vida moderna. Não é a febre da pressa, mas sim a pressa da febre. A vida moderna é um lazer agitado, uma fuga ao movimento ordenado por meio da agitação.
Fernando Pessoa, in 'Heróstato' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qua Set 16, 2009 12:17 pm | |
| A Alma Não se Usa na Superfície do Mundo
Se alguma coisa há que esta vida tem para nós, e, salvo a mesma vida, tenhamos que agradecer aos Deuses, é o dom de nos desconhecermos: de nos desconhecermos a nós mesmos e de nos desconhecermos uns aos outros. A alma humana é um abismo obscuro e viscoso, um poço que se não usa na superfície do mundo. Ninguém se amaria a si mesmo se deveras se conhecesse, e assim, não havendo a vaidade, que é o sangue da vida espiritual, morreríamos na alma de anemia. Ninguém conhece outro, e ainda bem que o não conhece, e, se o conhecesse, conheceria nele, ainda que mãe, mulher ou filho, o íntimo, metafísico inimigo.
Fernando Pessoa, in 'Livro do Desassossego' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qui Set 17, 2009 1:49 pm | |
| Conviver é Morrer
Colaborar, ligar-se, agir com outros, é um impulso metafisicamente mórbido. A alma que é dada ao indivíduo, não deve ser emprestada às suas relações com os outros. O facto divino de existir não deve ser entregue ao facto satânico de existir. Ao agir com outros perco, ao menos, uma coisa - que é agir só. Quando me entrego, embora pareça que me expando, limito-me. Conviver é morrer. Para mim, só a minha autoconsciência é real; os outros são fenómenos incertos nessa consciência, e a que seria mórbido emprestar uma realidade muito verdadeira. Cada palavra falada nos trai. A única comunicação tolerável é a palavra escrita, porque não é uma pedra em uma ponte entre almas, mas um raio de uma luz entre astros. Explicar é descrer. Toda a filosofia é uma diplomacia sob a espécie de eternidade (...) como a diplomacia, uma coisa substancialmente falsa, que existe não como coisa, mas inteira e absolutamente para um fim.
Fernando Pessoa, in 'Livro do Desassossego' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Sex Set 18, 2009 12:40 pm | |
| O Presente sem Passado nem Futuro
Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já o não tenho. Pesa-me um como a possibilidade de tudo, o outro como a realidade de nada. Não tenho esperanças nem saudades. Conhecendo o que tem sido a minha vida até hoje - tantas vezes e em tanto o contrário do que eu a desejara -, que posso presumir da minha vida de amanhã senão que será o que não presumo, o que não quero, o que me acontece de fora, até através da minha vontade? Nem tenho nada no meu passado que relembre com o desejo inútil de o repetir. Nunca fui senão um vestígio e um simulacro de mim. O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.
Fernando Pessoa, in 'Livro do Desassossego' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Seg Set 21, 2009 2:02 pm | |
| Liberdade
Ai que prazer Não cumprir um dever, Ter um livro para ler E não o fazer! Ler é maçada. Estudar é nada. O sol doira Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal, Sem edição original. E a brisa, essa, De tão naturalmente matinal, Como tem tempo não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta. Estudar é uma coisa em que está indistinta A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto é melhor, quando há bruma, Esperar por Dom Sebastião, Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças... Mas o melhor do mundo são as crianças, Flores, música, o luar, e o sol, que peca Só quando, em vez de criar, seca.
O mais do que isto É Jesus Cristo, Que não sabia nada de finanças Nem consta que tivesse biblioteca....
(Fernando Pessoa) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qui Set 24, 2009 5:26 pm | |
| O MOSTRENGO
O mostrengo que está no fim do mar Na noite de breu ergueu-se a voar; A roda da nau voou três vezes, Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar Nas minhas cavernas que não desvendo, Meus tectos negros do fim do mundo?» E o homem do leme disse, tremendo:
«El-Rei D. João Segundo!» «De quem são as velas onde me roço? De quem as quilhas que vejo e ouço?» Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso. «Quem vem poder o que só eu posso, Que moro onde nunca ninguém me visse E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse: «El-Rei D. João Segundo!» Três vezes do leme as mãos ergueu, Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes: «Aqui ao leme sou mais do que eu: Sou um povo que quer o mar que é teu; E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo, Manda a vontade, que me ata ao leme, De El-Rei D. João Segundo!»
Fernando Pessoa in Mensagem | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qua Out 21, 2009 8:59 pm | |
| No Túmulo de Christian Rosenkreutz
I
Quando, despertos deste sono, a vida, Soubermos o que somos, e o que foi Essa queda até corpo, essa descida Ate á noite que nos a Alma obstrui,
Conheceremos pois toda a escondida Verdade do que é tudo que há ou flui? Não: nem na Alma livre é conhecida... Nem Deus, que nos criou, em Si a inclui
Deus é o Homem de outro Deus maior: Adam Supremo, também teve Queda; Também, como foi nosso Criador,
Foi criado, e a Verdade lhe morreu... De Além o Abismo, Sprito Seu, Lha veda; Aquém não há no Mundo, Corpo Seu.
II
Mas antes era o Verbo, aqui perdido Quando a Infinita Luz, já apagada, Do Caos, chão do Ser, foi levantada Em Sombra, e o Verbo ausente escurecido.
Mas se a Alma sente a sua forma errada, Em si que é Sombra, vê enfim luzido O Verbo deste Mundo, humano e ungido, Rosa Perfeita, em Deus crucificada.
Então, senhores do limiar dos Céus, Podemos ir buscar além de Deus O Segredo do Mestre e o Bem profundo;
Não só de aqui, mas já de nós, despertos, No sangue actual de Cristo enfim libertos Do a Deus que morre a geração do Mundo.
III
Ah, mas aqui, onde irreais erramos, Dormimos o que somos, e a verdade, Inda que enfim em sonhos a vejamos, Vemo-la, porque em sonho, em falsidade.
Sombras buscando corpos, se os achamos Como sentir a sua realidade? Com mãos de sombra, Sombras, que tocamos? Nosso toque é ausência e vacuidade.
Quem desta Alma fechada nos liberta? Sem ver, ouvimos para além da sala De ser: mas como, aqui, a porta aberta?
Calmo na falsa morte a nós exposto, O Livro ocluso contra o peito posto, Nosso Pai Rosaecruz conhece e cala.
(Fernando Pessoa) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qua Dez 16, 2009 5:34 pm | |
| Aniversário...
No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos, Eu era feliz e ninguém estava morto. Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos, E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos, Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma, De ser inteligente para entre a família, E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim. Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças. Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.
Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo, O que fui de coração e parentesco. O que fui de serões de meia-província, O que fui de amarem-me e eu ser menino, O que fui - ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui... A que distância!... (Nem o acho...) O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!
O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa, Pondo grelado nas paredes... O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas), O que eu sou hoje é terem vendido a casa, É terem morrido todos, É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos... Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo! Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez, Por uma viagem metafísica e carnal, Com uma dualidade de eu para mim... Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!
Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui... A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos, O aparador com muitas coisas - doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado -, As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa, No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Pára, meu coração! Não penses! Deixa o pensar na cabeça! Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus! Hoje já não faço anos. Duro. Somam-se-me dias. Serei velho quando o for. Mais nada. Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
(Álvaro de Campos) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qua Jan 27, 2010 1:13 pm | |
| Da Verdade não Quero Mais que a Vida
Sob a leve tutela De deuses descuidosos, Quero gastar as concedidas horas Desta fadada vida. Nada podendo contra O ser que me fizeram, Desejo ao menos que me haja o Fado Dado a paz por destino. Da verdade não quero Mais que a vida; que os deuses Dão vida e não verdade, nem talvez Saibam qual a verdade.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qui Jan 28, 2010 1:19 pm | |
| Não Sejamos Inteiros numa Fé talvez sem Causa
Meu gesto que destrói A mole das formigas, Tomá-lo-ão elas por de um ser divino; Mas eu não sou divino para mim.
Assim talvez os deuses Para si o não sejam, E só de serem do que nós maiores Tirem o serem deuses para nós.
Seja qual for o certo, Mesmo para com esses Que cremos serem deuses, não sejamos Inteiros numa fé talvez sem causa.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Sex Jan 29, 2010 7:09 pm | |
| Cada um Cumpre o Destino que lhe Cumpre
Cada um cumpre o destino que lhe cumpre, E deseja o destino que deseja; Nem cumpre o que deseja, Nem deseja o que cumpre. Como as pedras na orla dos canteiros O Fado nos dispõe, e ali ficamos; Que a Sorte nos fez postos Onde houvemos de sê-lo. Não tenhamos melhor conhecimento Do que nos coube que de que nos coube. Cumpramos o que somos. Nada mais nos é dado.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Ter Fev 02, 2010 3:04 pm | |
| Aos Deuses Peço só que me Concedam o Nada lhes Pedir
Aos deuses peço só que me concedam O nada lhes pedir. A dita é um jugo E o ser feliz oprime Porque é um certo estado. Não quieto nem inquieto meu ser calmo Quero erguer alto acima de onde os homens Têm prazer ou dores.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qua Fev 03, 2010 2:49 pm | |
| É tão Suave a Fuga deste Dia
É tão suave a fuga deste dia, Lídia, que não parece, que vivemos. Sem dúvida que os deuses Nos são gratos esta hora,
Em paga nobre desta fé que temos Na exilada verdade dos seus corpos Nos dão o alto prêmio De nos deixarem ser
Convivas lúcidos da sua calma, Herdeiros um momento do seu jeito De viver toda a vida Dentro dum só momento,
Dum só momento, Lídia, em que afastados Das terrenas angústias recebemos Olímpicas delícias Dentro das nossas almas.
E um só momento nos sentimos deuses Imortais pela calma que vestimos E a altiva indiferença Às coisas passageiras
Como quem guarda a c'roa da vitória Estes fanados louros de um só dia Guardemos para termos, No futuro enrugado,
Perene à nossa vista a certa prova De que um momento os deuses nos amaram E nos deram uma hora Não nossa, mas do Olimpo.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Sex Fev 05, 2010 2:47 pm | |
| Vivo uma Vida que não Quero nem Amo
Súbdito inútil de astros dominantes, Passageiros como eu, vivo uma vida Que não quero nem amo, Minha porque sou ela,
No ergástulo de ser quem sou, contudo, De em mim pensar me livro, olhando no alto Os astros que dominam Submissos de os ver brilhar.
Vastidão vã que finge de infinito (Como se o infinito se pudesse ver!) - Dá-me ela a liberdade? Como, se ela a não tem?
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Seg Fev 08, 2010 5:38 pm | |
| O Erro de Querer Ser Igual a Alguém
Aqui, neste misérrimo desterro Onde nem desterrado estou, habito, Fiel, sem que queira, àquele antigo erro Pelo qual sou proscrito. O erro de querer ser igual a alguém Feliz em suma - quanto a sorte deu A cada coração o único bem De ele poder ser seu.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Ter Fev 09, 2010 1:58 pm | |
| Certeza Única é o Mal Presente
Pois que nada que dure, ou que, durando, Valha, neste confuso mundo obramos, E o mesmo útil para nós perdemos Conosco, cedo, cedo.
O prazer do momento anteponhamos À absurda cura do futuro, cuja Certeza única é o mal presente Com que o seu bem compramos.
Amanhã não existe. Meu somente É o momento, eu só quem existe Neste instante, que pode o derradeiro Ser de quem finjo ser?
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qua Fev 10, 2010 5:43 pm | |
| Cada Dia sem Gozo não Foi Teu
Cada dia sem gozo não foi teu Foi só durares nele. Quanto vivas Sem que o gozes, não vives.
Não pesa que amas, bebas ou sorrias: Basta o reflexo do sol ido na água De um charco, se te é grato.
Feliz o a quem, por ter em coisas mínimas Seu prazer posto, nenhum dia nega A natural ventura!
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Sex Fev 12, 2010 2:11 pm | |
| Nada Fica de Nada
Nada fica de nada. Nada somos. Um pouco ao sol e ao ar nos atrasamos Da irrespirável treva que nos pese Da humilde terra imposta, Cadáveres adiados que procriam.
Leis feitas, estátuas vistas, odes findas - Tudo tem cova sua. Se nós, carnes A que um íntimo sol dá sangue, temos Poente, por que não elas? Somos contos contando contos, nada.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Seg Mar 01, 2010 6:43 pm | |
| Somos Estrangeiros Onde quer que Estejamos
Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros Onde que quer que estejamos.
Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros Onde quer que moremos, tudo é alheio Nem fala língua nossa. Façamos de nós mesmos o retiro Onde esconder-nos, tímidos do insulto Do tumulto do mundo. Que quer o amor mais que não ser dos outros? Como um segredo dito nos mistérios, Seja sacro por nosso.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Qui Mar 04, 2010 7:08 pm | |
| Domina ou Cala
Domina ou cala. Não te percas, dando Aquilo que não tens. Que vale o César que serias? Goza Bastar-te o pouco que és. Melhor te acolhe a vil choupana dada Que o palácio devido.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Sex Mar 05, 2010 5:13 pm | |
| Não Tarda Nada Sermos
Breve o dia, breve o ano, breve tudo. Não tarda nada sermos. Isto, pensado, me de a mente absorve Todos mais pensamentos. O mesmo breve ser da mágoa pesa-me, Que, inda que mágoa, é vida.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Seg Mar 08, 2010 7:29 pm | |
| Sei Bem que Nunca Serei Ninguém
Sim, sei bem Que nunca serei alguém. Sei de sobra Que nunca terei uma obra. Sei, enfim, Que nunca saberei de mim. Sim, mas agora, Enquanto dura esta hora, Este luar, estes ramos, Esta paz em que estamos, Deixem-me crer O que nunca poderei ser.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Ter Mar 09, 2010 6:52 pm | |
| Não Sei se é Amor que Tens, ou Amor que Finges
Não sei se é amor que tens, ou amor que finges, O que me dás. Dás-mo. Tanto me basta. Já que o não sou por tempo, Seja eu jovem por erro. Pouco os deuses nos dão, e o pouco é falso. Porém, se o dão, falso que seja, a dádiva É verdadeira. Aceito, Cerro olhos: é bastante. Que mais quero?
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 Seg Mar 15, 2010 8:01 pm | |
| Não Sei de quem Recordo meu Passado
Não sei de quem recordo meu passado Que outrem fui quando o fui, nem me conheço Como sentindo com minha alma aquela Alma que a sentir lembro. De dia a outro nos desamparamos. Nada de verdadeiro a nós nos une Somos quem somos, e quem fomos foi Coisa vista por dentro.
Ricardo Reis, in "Odes" Heterónimo de Fernando Pessoa | |
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| Assunto: Re: FERNANDO PESSOA - COMPRE 1 LEVE 5 | |
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