| | BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA | |
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Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Qui Mar 04, 2010 9:38 pm | |
| Eugen Berthold Friedrich Brecht é um dos autores alemães mais importantes do século XX, especialmente nas suas facetas de dramaturgo e de poeta. De formação marxista, Bertolt Brecht (seu nome artístico) dava grande importância à dimensão pedagógica das suas obras de teatro: contrário à passividade do espectador, sua intenção era formar e estimular o pensamento crítico do público. Para isso, servia-se de efeitos de distanciamento, como máscaras, entreatos musicais ou painéis nos quais se comentava a ação. Brecht expôs em escritos de caráter teórico e encenações modelares essa nova forma de entender o teatro.
O reconhecimento de sua genialidade chegou muito depressa: em 1922, foi concedido ao jovem Brecht o prêmio Kleist por Tambores da Noite. No entanto, no princípio dedicou-se à assessoria artística, trabalhando, por exemplo, para o Teatro Alemão de Berlim, de Max Reinhard, entre 1924 e 1926. Brecht consolidou-se como escritor independente logo após os musicais Ópera dos Três Vinténs (1928) – que bem mais tarde inspiraria a Ópera do Malandro, do brasileiro Chico Buarque de Holanda – e Ascensão e Queda da Cidade de Mahagonny (1930), escritos em colaboração com o compositor Kurt Weil. A crítica social contida nessas obras e seu humor cínico causaram escândalo na República de Weimar alemã. A ascensão ao poder dos nazistas marcou o início de uma longa odisséia para Brecht, que, no final, o conduziu à Califórnia, onde permaneceu até o final da guerra e onde escreveu muitas das suas famosas obras teatrais: Galileu Galilei (1938), que aborda a responsabilidade da ciência, dando três pontos de vista distintos nas suas três versões; a peça antibelicista Mãe Coragem (1939); A Boa Pessoa de Setzuan (1941). Em colaboração com Lion Feuchtwanger, em As Visões de Simone Machard, transportou para a época da Segunda Guerra Mundial o mito de Joana d´Arc, personagem que já tinha abordado em 1930 em Santa Joana dos Matadouros, que só estreou em 1959. A obra contra Hitler, A Ascensão Irresistível de Arturo Ui, escrita no exílio na Finlândia, em 1941, só estreou depois da morte de Brecht. Após o regresso à Alemanha Oriental, fundou - e, a partir de 1949, dirigiu, conjuntamente com sua mulher - o Berliner Ensemble, onde se encenavam principalmente suas obras. Tal como as peças de teatro, a obra lírica de Brecht, publicada em quatro coleções, contém uma importante carga de crítica política e de ironia, embora também tenha composto poemas de amor muito pessoais. São especialmente conhecidas as Histórias do Sr. Keuner, coleção de breves episódios, que escreveu desde 1930 até a sua morte e foi publicada em 1958. | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Qui Mar 04, 2010 9:39 pm | |
| Elogio da Dialéctica
A injustiça passeia pelas ruas com passos seguros. Os dominadores estabelecem-se por dez mil anos. Só a força os garante. Tudo ficará como está. Nenhuma voz se levanta além da voz dos dominadores. No mercado da exploração diz-se em voz alta: Agora acaba de começar: E entre os oprimidos muitos dizem: Não se realizará jamais o que queremos! O que ainda vive não diga: jamais! O seguro não é seguro. Como está não ficará. Quando os dominadores falarem falarão também os dominados. Quem se atreve a dizer: jamais? De quem depende a continuação desse domínio? De quem depende a sua destruição? Igualmente de nós. Os caídos que se levantem! Os que estão perdidos que lutem! Quem reconhece a situação como pode calar-se? Os vencidos de agora serão os vencedores de amanhã. E o "hoje" nascerá do "jamais".
(Bertolt Brecht) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Sex Mar 05, 2010 9:44 pm | |
| A Verdade Unifica
Amigos, gostaria que soubésseis a Verdade e a dissésseis! Não como cansados Césares fugitivos: Amanhã vem farinha! Mas como Lenine: Amanhã à noitinha Estamos perdidos, se não... Ou como se diz na cantiguinha:
Irmãos, com esta questão Quero logo começar: Da nossa difícil situação Não há que escapar.
Amigos, uma forte confissão E um forte SE NÃO!
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Sáb Mar 06, 2010 11:09 pm | |
| Citações de Bertolt Brecht:
Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem Tema: Ordem Não conseguireis desgostar-me da guerra. Diz-se que ela destrói os fracos, mas a paz faz o mesmo Tema: Guerra Um homem tem sempre medo de uma mulher que o ame muito Fonte: "A Ópera dos Três Vinténs" Tema: Amor Primeiro vem o estômago, depois a moral Fonte: "A Ópera dos Três Vinténs" Tema: Moral Perante um obstáculo, a linha mais curta entre dois pontos pode ser a curva Fonte: "Vida de Galileu" Tema: Dificuldade De todas as coisas seguras, / a mais segura é a dúvida Fonte: "Um Homem é um Homem" Tema: Dúvida Pão e um gole de leite são vitórias! / Um quarto quente: uma batalha vencida! / Para te fazer crescer / Devo combater dia e noite Tema: Mãe Apenas a violência pode servir onde reina a violência, e / apenas os homens podem servir onde existem homens Fonte: "Santa Joana dos Matadouros" Tema: Violência A confiança pode exaurir-se caso seja muito exigida Fonte: "Vida de Galileu" Tema: Confiança Para quem tem uma boa posição social, / falar de comida é coisa baixa. / É compreensível: eles já comeram Fonte: "Breviário Alemão" Tema: Comida | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Ter Mar 09, 2010 12:16 am | |
| O «Ensina-me»
Quando era novo, mandei fazer numa tábua A canivete e nanquim a figura dum velho A coçar-se no peito por causa da sarna Mas de olhar implorativo porque esperava que o ensinassem. Uma segunda tábua pra o outro canto do quarto, Que devia representar um moço a ensiná-lo, Nunca mais foi feita.
Quando era novo tinha a esperança De encontrar um velho que se deixasse ensinar. Quando for velho, espero Que se encontre um moço e eu Me deixe ensinar.
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Ter Mar 09, 2010 10:04 pm | |
| Louvor do Esquecimento
Bom é o esquecimento. Senão como é que O filho deixaria a mãe que o amamentou? Que lhe deu a força dos membros e O retém para os experimentar.
Ou como havia o discípulo de abandonar o mestre Que lhe deu o saber? Quando o saber está dado O discípulo tem de se pôr a caminho.
Na velha casa Entram os novos moradores. Se os que a construíram ainda lá estivessem A casa seria pequena de mais.
O fogão aquece. O oleiro que o fez Já ninguém o conhece. O lavrador Não reconhece a broa de pão.
Como se levantaria, sem o esquecimento Da noite que apaga os rastos, o homem de manhã? Como é que o que foi espancado seis vezes Se ergueria do chão à sétima Pra lavrar o pedregal, pra voar Ao céu perigoso?
A fraqueza da memória dá Fortaleza aos homens.
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Qui Mar 11, 2010 12:11 am | |
| Citações de Bertolt Brecht:
Temam menos a morte e mais a vida insuficiente Tema: Morte A vida é curta e o dinheiro também Tema: Dinheiro O que não sabe é um ignorante, mas o que sabe e não diz nada é um criminoso Tema: Saber Apenas quando somos instruídos pela realidade é que podemos mudá-la Tema: Revolução O amor é a arte de criar algo com a ajuda da capacidade do outro Tema: Amor Miserável país aquele que não tem heróis. Miserável país aquele que precisa de heróis Tema: Heroísmo A verdade consegue impor-se apenas na medida em que nós a impomos; a vitória da razão só pode ser a vitória daqueles que a possuem Tema: Verdade Quem não conhece a verdade não passa de um tolo; mas quem a conhece e a chama de mentira é um criminoso! Tema: Verdade Todos correm atrás da felicidade, mas a felicidade está a correr atrás de todos Tema: Felicidade Não há problema em hesitar se depois prosseguir Tema: Hesitação | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Qui Mar 11, 2010 4:24 pm | |
| De que Serve a Bondade
De que serve a bondade Quando os bondosos são logo abatidos, ou são abatidos Aqueles para quem foram bondosos?
De que serve a liberdade Quando os livres têm que viver entre os não-livres?
De que serve a razão Quando só a sem-razão arranja a comida de que cada um precisa?
Em vez de serdes só bondosos, esforçai-vos Por criar uma situação que torne possível a bondade, e melhor; A faça supérflua!
Em vez de serdes só livres, esforçai-vos Por criar uma situação que a todos liberte E também o amor da liberdade Faça supérfluo!
Em vez de serdes só razoáveis, esforçai-vos Por criar uma situação que faça da sem-razão dos indivíduos Um mau negócio!
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Sex Mar 12, 2010 11:05 pm | |
| Louvor do Revolucionário
Quando a opressão aumenta Muitos se desencorajam Mas a coragem dele cresce. Ele organiza a luta Pelo tostão do salário, pela água do chá E pelo poder no Estado. Pergunta à propriedade: Donde vens tu? Pergunta às opiniões: A quem aproveitais?
Onde quer que todos calem Ali falará ele E onde reina a opressão e se fala do Destino Ele nomeará os nomes.
Onde se senta à mesa Senta-se a insatisfação à mesa A comida estraga-se E reconhece-se que o quarto é acanhado.
Pra onde quer que o expulsem, para lá Vai a revolta, e donde é escorraçado Fica ainda lá o desassossego.
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Sáb Mar 13, 2010 8:13 pm | |
| Citações de Bertolt Brecht:
Muitos juízes são absolutamente incorruptíveis; ninguém consegue induzi-los a fazer justiça Tema: Juiz A guerra encontra sempre um caminho Tema: Guerra Que é roubar um banco em comparação com fundar um banco? Tema: Negócios As mães dos soldados mortos são juízes da guerra Tema: Guerra Quando a verdade for demasiado débil para se defender, terá de passar ao ataque Tema: Verdade As convicções são esperanças Tema: Convicção Não se tira nada de nada, o novo vem do antigo, mas nem por isso é menos novo Tema: Novidade Um homem deve ter pelo menos dois vícios. Um só é demasiado Tema: Vício
Porque não me fio nele, somos amigos Tema: Amigo Terrível é a tentação de querer ser Deus Tema: Deus A ambição da ciência não é abrir a porta do saber infinito, mas pôr um limite ao erro infinito Tema: Ciência Pergunte sempre a cada ideia: a quem serves? Tema: Proveito | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Dom Mar 14, 2010 8:57 pm | |
| O Camponês Trata das Leiras
O camponês trata das leiras Mantém em forma as vacas, paga impostos Faz filhos pra poupar criados e Está dependente do preço do leite. Os da cidade falam do amor ao torrão Da sadia cepa campesina e Que o camponês é o fundamento da Nação.
Os da cidade falam do amor ao torrão Da sadia cepa campesina e Que o camponês é o fundamento da Nação. O camponês trata das leiras Mantém em forma as vacas, paga impostos Faz filhos pra poupar criados e Está dependente do preço do leite.
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Qua Mar 17, 2010 1:03 am | |
| Louvor do Aprender
Aprende o mais simples! Pra aqueles Cujo tempo chegou Nunca é tarde de mais! Aprende o abc, não chega, mas Aprende-o! E não te enfades! Começa! Tens de saber tudo! Tens de tomar a chefia!
Aprende, homem do asilo! Aprende, homem na prisão! Aprende, mulher na cozinha! Aprende, sexagenária! Tens de tomar a chefia!
Frequenta a escola, homem sem casa! Arranja saber, homem com frio! Faminto, pega no livro: é uma arma. Tens de tomar a chefia.
Não te acanhes de perguntar, companheiro! Não deixes que te metam patranhas na cabeça: Vê c'os teus próprios olhos! O que tu mesmo não sabes Não o sabes. Verifica a conta: És tu que a pagas. Põe o dedo em cada parcela, Pergunta: Como aparece isto aqui? Tens de tomar a chefia.
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Dom Mar 21, 2010 12:30 am | |
| Sobra a Construção de Obras Duradouras
Quanto tempo Duram as obras? Tanto Quanto o preciso pra ficarem prontas. Pois enquanto dão que fazer Não ruem.
Convidando ao esforço Compensando a participação A sua essência é duradoura enquanto Convidam e compensam.
As úteis Pedem homens As artísticas Têm lugar pra a arte As sábias Pedem sabedoria As destinadas à perfeição Mostram lacunas As que duram muito Estão sempre pra cair As planeadas verdadeiramente em grande Estão por acabar.
Incompletas ainda Como o muro à espera da hera (Esse esteve um dia inacabado Há muito tempo, antes de vir a hera, nu!) Insustentável ainda Como a máquina que se usa Embora já não chegue Mas promete outra melhor. Assim terá de construir-se A obra pra durar como A máquina cheia de defeitos.
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Seg Mar 22, 2010 2:07 pm | |
| "O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo."
(Bertolt Brecht) | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Qua Mar 24, 2010 9:09 pm | |
| O Horror de ser Pobre
Risco c'um traço (Um traço fino, sem azedume) Todos os que conheço, eu mesmo incluído. Para todos estes não me verão Nunca mais Olhar com azedume.
O horror de ser pobre! Muitos gabavam-se que aguentariam, mas era ver- -lhes as caras alguns anos depois! Cheiros de latrina e papéis de parede podres Atiravam abaixo homens de peitaça larga como toiros. As couves aguadas Destroem planos que fazem forte um povo. Sem água de banho, solidão e tabaco Nada há que exigir. O desprezo do público Arruina o espinhaço. O pobre Nunca está sozinho. Estão todos sempre A espreitar-lhe pra o quarto. Abrem-lhe buracos No prato da comida. Não sabe pra onde há-de ir. O céu é o seu tecto, e chove-lhe lá pra dentro. A Terra enxota-o. O vento Não o conhece. A noite faz dele um aleijado. O dia Deixa-o nu. Nada é o dinheiro que se tem. Não salva ninguém. Mas nada ajuda Quem dinheiro não tem.
Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Sáb Mar 27, 2010 11:42 am | |
| Contra a Sedução
Não vos deixeis seduzir! Regresso não pode haver. O dia já fecha as portas, Já sentis o frio da noite: Não haverá amanhã.
Não vos deixeis enganar, E que a vida pouco vale! Sorvei-a a goles profundos! Pois não vos pode bastar Que tenhais de a abandonar!
Não vos contenteis de esp'ranças, Que o tempo não é demais! Aos mortos a podridão! O maior que há é a vida: E ela já não está pronta.
Não vos deixeis seduzir Ao moirejo e à miséria! Que pode fazer-vos o medo? Morreis como os bichos todos, E depois não há mais nada.
Bertold Brecht, in 'Canções e Baladas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Seg Mar 29, 2010 10:53 pm | |
| Canção da Inocência Perdida
O que a minha mãe dizia Não pode ser bem verdade: Que uma vez emporcalhada Nunca passa a sujidade. Se isto não vale pra a roupa Também não vale pra mim. Que o rio lhe passe por cima Breve fica branca, assim.
Como qualquer pataqueira Aos onze anos já pecava. Mas só ao fazer catorze O meu corpo castigava. A roupa já estava parda, No rio a fui mergulhar. No cesto está virginal C'mo sem ninguém lhe tocar.
Sem ter conhecido algum Já eu tinha escorregado. Fedia aos Céus, como uma Babilónia de pecado. A roupa branca no rio Enxaguada à roda, à roda, Sente que as ondas a beijam: «Volta-me a brancura toda».
Quando o primeiro me amou Abracei-o eu também. Senti no ventre e no peito Ir-se a maldade pra além. Assim acontece à roupa E a mim acontecerá. A água corre depressa, Sujidade diz: Vem cá!
Mas quando os outros vieram Um ano mau começou. Chamaram-me nomes feios, Coisa feia agora sou. Com poupanças e jejuns Nenhuma mulher se acalma. Roupa guardada na arca, Na arca se não faz alva.
E veio depois um outro No ano que se seguiu. Vi que me fazia outra Com o tempo que fugiu. Mete-a na água e sacode-a! Há sol, cloreto e vento! Usa-a, dá-a de presente: Fica fresquinha a contento.
Bem sei: Muito pode vir 'Té que nada por fim. fica. Só quando ninguém a usa A roupa se sacrifica. E uma vez que apodreça Nenhum rio a embranquece. Leva-a consigo em farrapos. Um dia assim te acontece.
Bertold Brecht, in 'Canções e Baladas' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Ter Mar 30, 2010 6:54 pm | |
| Prazeres
O primeiro olhar da janela de manhã O velho livro de novo encontrado Rostos animados Neve, o mudar das estações O jornal O cão A dialéctica Tomar duche, nadar Velha música Sapatos cómodos Compreender Música nova Escrever, plantar Viajar, cantar Ser amável.
Bertold Brecht, in 'Do Pobre B.B.' | |
| | | Anarca
Mensagens : 13406 Data de inscrição : 02/06/2009
| Assunto: Re: BERTOLT BRECHT - O POETA MARXISTA Qui Abr 01, 2010 8:50 pm | |
| Nunca te Amei Tanto
Nunca te amei tanto, ma soeur, Como quando de ti parti naquele pôr-de-sol. O bosque engoliu-me, o bosque azul, ma soeur, Sobre que já pousavam as estrelas pálidas a oeste.
Não me ri nem um pouco, nada, ma soeur, Eu que a brincar ia ao encontro dum destino escuro — Enquanto os rostos já atrás de mim Devagar empalideciam no anoitecer do bosque azul. Tudo era belo naquele anoitecer único, ma soeur, Nunca mais depois e nunca antes assim — Verdade é: só me ficaram as grandes aves Que ao anoitecer têm fome no céu escuro.
Bertold Brecht, in 'Do Pobre B.B.' | |
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